Menti, e temi que isso se percebesse.
Ele olhou para mim durante intermináveis segundos.
Ouvi passos de alguém a descer escadas e fixei o meu olhar no chão de
pedra marfim; era Harry.
- Então meninos? Portaram-se bem ou nem por isso? – Perguntou ele e
eu olhei-o, semicerrando os olhos.
Vislumbrei um sorriso trocista no seu rosto, mas continuei em
silêncio. Em poucos passos, dirigi-me de novo ao tacho do arroz doce e peguei
na colher que Louis movia em movimentos circulares e lentos. Ele olhou-me de
relance e deixou-se ficar ao meu lado.
- Amanhã é a minha vez de te ter durante o dia – sussurrou-me ao
ouvido, fazendo-me estremecer.
Depois afastou-se e eu vi-o a caminhar em direção à sala de estar.
Passou por Harry, não lhe dirigindo a palavra, e este olhava para mim a
comprimir os lábios num sorriso de palhaço.
- Vai haver confusão – cantarolou, rodando nos calcanhares na mesma
direção que Louis.
Suspirei pesadamente e continuei a mexer o arroz doce, à espera de
Anne. Aproximei o rosto do tacho e aspirei o ar com leveza. Faltava algo;
então, atrevi-me a retirar uma colher da gaveta dos talheres e a experimentar o
doce.
Estalei a língua, percebendo que faltava a canela. Em poucos segundos
percorri a cozinha com o olhar e com as mãos, à procura de pauzinhos de canela,
e quando os encontrei, apressei-me a continuar a mexer no tacho e a mergulhar
por completo dois pauzinhos.
Pouco depois Anne aparecera com um sorriso radiante vestida com
calças de ganga desbotadas e uma camisola verde simples. Trazia um fio preto
que segurava uma cruz.
- Obrigada, querida – disse, estendendo a mão para eu lhe passar a
colher e dar-lhe a vez de continuar a mexer o doce. – Podes ir ter com eles –
disse-me com um sorriso.
- De certeza que não precisa mais de ajuda?
Anne deu uma risadinha.
- Não, Bella, se eu precisar chamo-te.
Assenti, com um acendo de cabeça e fui ter com Harry e Louis,
cautelosamente.
A sala de estar da casa de Harry era confortavelmente espaçosa e agradável.
O sofá era castanho e grande, dando lugar para mais de seis pessoas sentadas.
Havia a poltrona, da mesma cor que o sofá, junto à janela que dava acesso à
entrada principal da casa. Harry e Louis concentravam-se numa gravação do jogo
do Manchester United contra outra equipa de futebol que não consegui reconhecer
ser qual.
Aproximei-me lentamente do sofá e Harry olhou para mim.
- Senta-te – pediu, batendo palmas no lugar ao lado dele.
Trinquei o lábio e fiz o que me pediu, sempre vigiada pelos olhos ansiosos
de Louis. Assisti o jogo, calada, sempre a remoer nos meus pensamentos. Tanto
um como o outro entusiasmava-se com facilidade a ver um grupo de homens a
passar uma bola de um lado para o outro. Louis era o que se irritava depressa.
Porque teria Harry o convidado para o almoço de família? Ainda não
tivera tempo para pensar por que razão teria ele me convidado a mim, mas, honestamente, isso era a
última coisa com que me teria de preocupar. Estaria Harry a testar-me? Ele
sabia que ainda só o tinha visto a ele. Ele sabia que sentiria o coração
apertado ao ver Louis pela primeira vez. Harry sabia que a minha ferida ainda
não cicatrizara…
- Golo! – Gritou Louis com convicção e ânimo. Acompanhei o seu corpo,
com o olhar, enquanto ele se levantava do sofá e celebrava a marcação da equipa
do Manchester.
Lá no fundo, não conseguia aceitar o facto de que gostava dele
também. Não me parecia certo ter sentimentos por duas pessoas ao mesmo tempo,
ainda para mais quando se tratava de… Love.
Ouvimos a porta principal abrir e os três virámos a cabeça para saber
quem chegara.
- Já aqui estamos, querida! – Disse uma voz masculina.
Uma rapariga alta (claro) e bastante bonita apareceu na sala e
sorriu-nos com louvor.
- Finalmente chegaram – disse Harry. – Já estou a morrer de fome.
A rapariga ficou a olhar para mim durante um certo tempo e depois
virou-se para Harry, dando-lhe um abraço. Cumprimentou Louis com um beijo na
cara e voltou a olhar-me.
- É a Bella? – Perguntou, mais para Harry do que para mim.
- Sim, Gemma.
Outra figura – desta vez masculina – entrou na sala; esfregava as
mãos com força, um sinal de que o frio instalara-se na rua para ficar. Louis
voltou a sentar-se no sofá e às vezes olhava-me de relance.
- Olá Bella – cumprimentou-me Gemma e aproximou-se de mim –, sou a
irmã do Harry.
- O-Olá – gaguejei. Era intimidante ver uma rapariga com quase o
dobro do meu tamanho.
- E eu sou o Robin, padrasto do Harry – disse o homem com um sorriso,
o que me acalmou um pouco os nervos.